sábado, 26 de setembro de 2009

Cotidiano [2]

Fui acordado mais pelo calor que pela claridade. Chutei um canto vazio da cama à procura de companhia. Não vi quando ela saíra, ou como se desprendera dos meus braços. Procurei sem grande entusiamo o celular para descobrir as horas. Estava por cima dos lençóis jogado, e havia nele uma mensagem: "Não quis te acordar, você está só em casa". Não parecia que estava. Todos aqueles clarões que se misturavam ao silêncio... e eu tinha o dia inteiro para encontrá-la entre eles. A melancolia me prendia ao passado imediato por um presente que me escapou aos sentidos.
Só acreditara no que tinha se passado e estava prestes a se passar quando, antes de desligar, dissera: "beijo" - e ela respondera. Não parecia que dormira na casa dela - ela, eu nem sabia direito quem.
Ela não me chamou, eu não me impus, mas ambos sabíamos que eu dormiria lá de novo. Cidade nova, fui fazer quaisquer outras coisas. Nem de turista. Fui andar - não totalmente sem rumo, estava na certeza de onde meus caminhos me levariam à noite. Apareci à porta. Ela me esperava. Chamou-me para dentro com o beijo que prometera ao telefone.
O turbilhão-de-tudo-novo da cidade grande me atordoava; o cansaço de dias que não viram uma noite me vencia. Meu estado, apesar de pouco álcool, era de ebriedade - mais moral e lírica que etílica. Não recordo de todos os detalhes. Mas a tatuagem que ela tinha e que tomava boa parte das costas... Me intrigava. Parecia se mexer quando ela se contorcia; parecia gritar junto com ela. Não sei como terminou, mas, numa hora, estávamos abraçados.
Ela dormia com os cabelos longos sobre meu rosto, tomando meus olhos e minhas narinas. Me viro e tateio a mesa de cabeceira em busca de algo - qualquer coisa, já que não queria nada. Acho e puxo um livro. Depois os óculos; leio algo sobre a teoria da relatividade - sorri pensando que aquilo tudo estava há muito no passado para mim. O tempo alternava entre se arrastar e correr - sem lógica, sem padrão, sem ampulheta, sem observador: eu havia voltado a dormir.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Conversa com deus [5]

- Eu sou o maior megalômano do mundo!
- Oi, Deus.
- Não vi você chegando, MEU filho.
- Não vejo grau de parentesco.
- Eu sou possessivo.
- Achei que tinha megalomania.
- Eu sou o homem mais possessivo do mundo!
- Homem?
- Deus. Mas é que não faria sentido falar no deus mais possessivo de todos.
- Nem Alá?
- Ele dá 72 virgens.