É verdade, esta está longe de ser uma história emocionante. Está mais para uma aventura do real. Também não é uma história longa: o tempo passa rápido demais para aqueles que dormem profundamente um sono leve e perturbado. E, ainda por cima, curto. Ele acorda primeiro. Mente vazia. Essa é a melhor maneira de se pegar os sonhos.
Os sonhos começam grandes e complexos, cheios de detalhes, e, à medida que o tempo de sono vai passando e a hora de acordar, se aproximando, ele vai se afunilando, até que, no instante que representa o transe entre viver um mundo e outro, que começa quando certas partes do cérebro diminuem o ritmo de trabalho e termina quando os olhos estão definitivamente abertos, o sonho é representado por apenas um curto fio. Ele segue seu rumo até passar por debaixo da porta que leva para além da consciência, definitivamente trancada com todas as chaves. Os sonhos fogem quando já se sai diretamente do transe a pensar: “está tarde!”, “está cedo!”, ou “preciso lembrar o que sonhei!”.
E, de fato, mantinha a mente vazia, sendo daí capaz de puxar o fio, que ia ficando mais largo, e trazia consigo o sonho, todo fragmentado em pedaços pequenos, imagens congeladas, a pedaços grandes, cenas inteiras, às vezes desfocadas. Poderia costurá-lo novamente, se quisesse. Reviu parte das imagens que perambularam por sua mente nas últimas horas. Cenas que pareciam verdadeiras demais até para a realidade de um dia útil.
Não querendo continuar a rever os caminhos percorridos no sonho, começou a pensar em outras coisas, abriu os olhos, e, com isso, escapou-lhe à mão a corda; dessa forma, o sonho retornou a seu rumo para além da porta inacessível, num movimento tão inevitável como o de um balão de hélio sobe quando a criança se lhe desprende sem querer.
Olhou para os lados com as pálpebras semi-cerradas. Parecia ter sido o primeiro a acordar. Tanto fazia. O sol ainda tímido batia nas cortinas e pedia passagem. Por que tudo aquilo? Tudo isso à noite. Todos esses pensamentos. Todos esses sonhos. Quis crer que a vida era mais simples que o que parecia. Sem qualquer cerimônia, jogou de lado o lençol e, a vestir nada, foi escorregando até o banheiro escovar os dentes. Um novo dia qualquer começava. E como estava quente!