(David, A morte de Sócrates)
Parte I – a Morte pela arte e mitologia
Pisterovix saúda os visitantes, estas idéias perambulando pela internet, expandindo seu campo eletromagnético de conhecimento. É a primeira vez que ele posta, e seria recomendável, sob análise das duras regras da etiqueta, que fosse cortês com os convidados. Etiqueta esta, por sinal, lembra-me que a educação – parte menos exagerada daquela – morreu, o que me faz voltar ao título do texto (para os preguiçosos, “A Morte e a Morte (e a morte)”).
Uma das temáticas sugeridas num dos encontros foi a morte, o que inspira poetas, pintores e demais mestres nas diversas formas de manifestação da arte. Não sou poeta, pintor, muito menos músico ou até dançarino (dançar algo com inspiração na morte talvez não fosse uma tarefa fácil, por sinal). Pode-se pensar que não se deve haver muito a se falar sobre a morte, supondo, de modo a concordar com a ciência, que as pessoas que dizem ter conversado com os mortos mentiram ou sonharam, e que apenas se sabe que acontece, ou até porque acontece. Nada mais que isso. Nada depois disso - ao menos, nada que misture religião.
(Baglione - A morte de São Sebastião)
(Caravaggio - A incredulidade de São Tomé)
Há várias maneiras de se trabalhar a morte.
“Quando a Indesejada das gentes chegar
(Não sei se dura ou caroável),
Talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
- Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
(A noite com seus sortilégios.)
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.”
Essa é uma das maneiras que Bandeira, que intensamente conviveu com a morte desde seus dezessete anos, escolheu para mencionar o tema. Desprezo, frio. A morte vem... Estou à sua espera. A mesa está posta, jante comigo. (Isso daria uma ótima crônica para um bom cronista). Há para quem a morte é sagrada, seja porque há vida eterna depois dela, seja porque ela marca o fim da única jornada que temos, ou seja porque ela mesma é representada por um deus ou deusa. Como para os astecas. “MICTLANTECUHTLE, também denominado Micli ou Mictlantecuhtli (senhor do reino dos mortos, na língua asteca), é um deus que é o governante de Mictlan, a camada mais profunda do submundo asteca. É representado por uma pessoa vestindo uma caveira com dentes salientes, ou como um esqueleto. Sua esposa é Mictecacihuatl. Seus animais simbólicos são a aranha, a coruja e o morcego. É o deus regente do signo do Cão no horóscopo asteca.” (extraído da Wikipedia). Encontramos nas mitologias, assim como no texto de Manuel Bandeira acima disposto, a morte personificada. Nos quadrinhos de Hellblazer, talvez mais famoso pelo nome de John Constantine (quem não assistiu à mega-produção cinematográfica?), Mictlantecuhtole aparece como antagonista.
No livro “As intermitências da morte”, do escritor José Saramago, ganhador do Nobel, a morte aparece cômica, simpática, até mais humana. Em sua visão, a morte não é mais que, ironicamente, um funcionário do poder máximo, como se se encarregasse da faxina.
(Osíris) (Tribunal de Osíris)
Há, também, os cépticos, como os mesopotâmicos, que acreditavam no pó após a morte. Não há vida. Viramos espíritos que vagam e alimentam-se de pó – fosse verdade, as casas mal-assombradas seriam lugares limpos o suficiente para você comer na mesa sem precisar passar "um paninho" antes. E há os mais cépticos. Morreu, vai comer capim pela raiz, ficar a sete palmos, dormir com os peixes, e não terá como criar mais eufemismos envolvendo aspectos naturais – naturais como a morte é natural.
“Morrer.
Morrer de corpo e de alma.
Completamente.
Morrer sem deixar o triste despojo da carne,
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão — felizes! — num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.
Morrer sem deixar porventura uma alma errante...
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?
Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,
A lembrança de uma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento,
Em nenhuma epiderme.
Morrer tão completamente
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: “Quem foi?...”
Morrer mais completamente ainda,
— Sem deixar sequer esse nome.”
Novamente por Bandeira, em cuja obra, já se pode ter percebido, a temática da morte é constante. Pode ter sido o caso dele descrito em sua própria frase: “A vida inteira que poderia ter sido e que não foi.”, o caso dos que olham para trás com desespero, uma amargura de insatisfação, e, agora, de impotência – nada pode ser feito em relação ao próprio passado. É mais um tipo de morte, costuma acontecer antes das demais: a morte psicológica.
(A morte do Ego)
Quincas Berro-D’Água, cujo nome foi dado pelo grito ouvido por toda a Bahia, ao confundir água e sua inconfundível bebida, nomeou, sem pretender, meu texto. O livro em que aparece é “A morte e a morte de Quincas Berro-D’Água”, do baiano Jorge Amado. O escritor foi mais esperto que seu personagem, pois a confusão que fez foi proposital. Por que “a morte e a morte”? Ora, Quincas não foi presenteado com a sorte. Não agüentava viver
Morremos. Fato. Será que não deixamos nada para trás? Há uma frase que diz que uma vida é bem vivida quando fazemos algo que mereça ser escrito ou quando escrevermos algo que mereça ser lido. Todos os povos e artistas citados aqui hoje cumpriram seu papel. E você, o que já fez?
4 comentários:
O que seria de vc sem uma pitada de sarcasmo e uma fina ironia, heim? heuheuheueheuheu! Seu texto é brilhante em todos os sentidos! Rico em informações e aborda uma temática muito interessante. A morte... Espero que não morramos psicologicamente, caro Philipe, e nem socialmente. Que sejamos mais tarde lembrados, nem que seja por alguns poucos amigos, como alguém que não deixou a vida escorrer por entre os dedos... Quando a morte física vier, espero que tenhamos conseguido deixar um pedacinho de nós no coração de quem amamos! ^^ Te Dolu, minino!! Continue seus escritos e bola pra frente! xD
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