Para aquele que quiser tornar-se sábio, é de grande proveito ter tido durante certo tempo a concepção do homem fundamentalmente mau e corrupto: é falsa a concepção oposta, mas, durante épocas inteiras, foi ela que dominou e suas raízes se ramificaram até dentro de nós e de nosso mundo. Para nos compreeendermos, temos de compreendê-la; mas para depois subir mais alto, temos de superá-la. Reconhecemos então que não há pecados no sentido metafísico; mas que, no mesmo sentido, tampoucou há virtudes; que todo esse domínbio de idéias morais está oscilando constantemente, que há conceitos mais elevados e mais baixos do bom e do mau, do moral e do imoral. Aquele que não requer das coisas mais do que conhecê-las chega facilmente a viver em paz com sua alma e é quando muito por ingnorância, mas dificilmente por concupiscência que vai errar (ou pecar, como diz o mundo). Não vai querer mais excomungar e extirpar os apetites; mas o objetivo único que o domina inteiramente, de conhecer a todo momento tão bem quanto possível, vai lhe dar sangue-frio e vai apaziguar tudo o que há de selvagem em sua natureza. Além disso, desembaraçou-se de uma multidão de idéias torturantes, já não se impressiona mais com as palavras sobre as penas do inferno, sobre o estado de pecado, sobre a incapacidade para o bem: apenas reconhece nisso as sombras evanescentes de concepções de mundo e de vida, que são falsas.
(Nietzsche, F., Humano, Demasiado Humano, Ed. Escala)
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