sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Notas sobre ecopolítica



É corrente entre os cientistas a atitude de deplorar a “politização” da política internacional ambientalista, a intrusão tida como ilegítima de considerações políticas sobre os problemas considerados de sobrevivência – tendo como base os próprios argumentos científicos irrefutáveis. Constatamos os fatos das degradações ambientais e suas implicações, mas deve-se reconhecer que resultam de atividades econômicas e sociais. É daí, então, que começa a surgir a conexão estabelecida entre os problemas ambientais e a necessidade de intervenção da área política, criando o que poderíamos chamar de ecopolítica, que faz referência ao conjunto das dimensões políticas da identificação e da resolução de questões ambientais (Prestr e, 2001).


A constatação que devemos fazer para um primeiro contato é que, se “os problemas do meio ambiente refletem, ao mesmo tempo, preocupações científicas e certa hierarquia de valores” e “não existe melhor decisão; o que existe é uma direção” (Prestre, 2001), também considerando a afirmação de Pierre Mendes-France em que “governar é escolher”, essa direção, portanto, caberia à política dar. Para selecionar a direção que será tomada como a mais própria, a política pode recorrer às suas fontes regularmente tidas como principais nesse caso, que são a ciência, as vontades e necessidades sociais, a conjuntura regional da atuação das ações políticas.


Norberto Bobbio (2001) estabelece, em seus escritos sobre política e moral, distinções fundamentais, ambas domínios da práxis humana. Para ele, diferem-se, pois, no critério de justificação e de avaliação das respectivas ações. Lembra-se a convincente distinção weberiana entre ética da convicção e ética da responsabilidade, em que, respectivamente, uma lida com o meio – equivalente à procura única pela preservação, sem ter em mente suas decorrências –, e a outra, com o fim – o desenvolvimento econômico, por assim dizer. Chegamos, analisando de modo maniqueísta, no que Prestre (2001) lembra ser um refrão comumente repetido em discussões que dizem respeito ao meio ambiente: “se o político soubesse! Se o ecologista pudesse!”. Se, por um lado, o ambientalista, que preza pela defesa incondicional do meio ambiente, o político, pertencente ao jogo de Estado, obrigado a lidar com a hierarquia das prioridades nacionais, definidas por Prestre como sendo: segurança nacional, saúde pública, crescimento econômico e emprego, desenvolvimento regional, redistribuição de renda, igualdade de oportunidades e, só então, qualidade do meio ambiente. A qualidade do meio ambiente só se encontraria com as categorias mais prioritárias nesse aspecto se se relacionasse com alguma delas, ficando subordinadas ou sublevadas.


Inicialmente, a criação de políticas ambientais nacionais vai surgir mais intimamente ligada, na terminologia de Weber, a uma ética da convicção, e é exatamente por isso que serão bem menos atuantes e efetivas em suas aplicações. A formulação dessas políticas estava mais ligada à fonte científica e mais desligada das outras, estando, portanto, também mais longe da realidade regional. Com o desenvolvimento de novas técnicas, novos estudos e o surgimento de novas exigências sociais – o que inclui os grupos que “perdiam” com essas políticas, como os industriais, mais diretamente afetados –, houve a necessidade de readaptação dessas políticas. Provou-se que essa preservação hoje seria, de certo modo, um investimento que atrasaria em três meses a economia até o ano de 2049, e que, caso não fosse feito, poderia vir a custar quase uma década de paralisação econômica para se tentar chegar a um mesmo nível de redução de poluentes. Seria, assim, um investimento muito falido; ainda, constatou-se a rentabilidade de vários processos econômicos que envolviam a preservação ambiental, tal qual o ecoturismo. Essas constatações reaproximam a ação política ambiental com a ética de responsabilidade, que vai, mesmo pregando uma ética de convicção, almejar conter o possível refreamento econômico, levantando, possivelmente, as bandeiras da distribuição de renda e outras similares.


Assim, fica resolvido o aparente paradoxo de misturar éticas inerentes à formulação das políticas ambientais, que necessariamente passa por julgamentos éticos – bioética. É esse o filtro que define algumas linhas de prioridade dentro do campo do meio ambiente, bem como conceitos e normatizações pelas quais se deve prezar. As questões ambientais não se podem deixar de vincular da política – ecopolítica –, e é nesse âmbito cuja efetividade é questionada, embora seja o político o único meio em que se pode efetivamente aplicar mudanças. A ecopolítica se coloca como essencial na ação de conter os impactos ambientais, garantir o bem-estar e a vida dos seres humanos, mobilizar a máquina pública, e, em seu sentido internacional, reaproximar o mundo pela cooperação nesses aspectos. Por fim, para Prestre, nem mesmo os mais indiferentes podem ignorar as questões ambientais, sua relação com moral, ética, política, e suas implicações para, além de outros fatores cruciais, segurança interna e externa dos Estados e a vida do homem.


Um comentário:

Engel disse...

É extremamente interessante a conceituação a aplicação da citada ecopolítica, uma vez que esta visa ao bem estar do ser humano e a possibilidade deste sobreviver na Terra. O planeta não precisa ser salvo, nós sim.

Excelente texto.