quarta-feira, 20 de agosto de 2008

A orelha

De todos os órgãos do corpo, a orelha é o única cuja forma ultrapassa a função. Todos os outros órgãos têm a forma adequada à sua finalidade - mais da metade das curvas e nichos da orelha são desnecessárias. São, portanto, puro exibicionismo. A complexidade interna do ouvido - seus labirintos e artelhos - se justifica. Nada justifica as viravoltas externas da orelha, as falsas entradas, os cornichos, as cavernas, desafios à logica e ao cotonete. Alguns órgãos do corpo chegam ao barroco, só a orelha dá o passo fatal, que acabou com o Renascimento, para o rococó. A orelha denuncia uma perigosa tendência latente na criação para o excesso, para a forma pela forma, para o ornamentalismo vazio. Achei que devia fazer este alerta.

Veríssimo, Luis F. - Mais comédias para se ler na escola, pág. 109

Um comentário:

Engel disse...

Ainda me questiono sobre o apêndice hmm...
Mas a orelha é, de fato, outro ponto interessante